Consulta prévia ao povo Wajãpi discute definição dos limites entre assentamento da Perimetral Norte e Floresta Estadual do Amapá
Com objetivo de retomar o debate sobre uma proposta governamental de alteração nos limites entre o Projeto de Assentamento Perimetral Norte, situado na BR-210, e a Floresta Estadual do Amapá (Flota), em uma área contígua à Terra Indígena Wajãpi (TIW), foi realizada a 3ª Etapa da Consulta Prévia aos povos Wajãpi.
A reunião, convocada pelo Ministério Público Federal (MPF) a pedido do Conselho de Aldeias Wajãpi – Apina, teve a finalidade de consultar os Wajãpi sobre a nova proposta elaborada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) em conjunto com a Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Amapá (SEMA) e o Instituto de Terras do Estado do Amapá (Amapá Terras).
A primeira proposta de redefinição dos limites entre o assentamento e a Unidade de Conservação estadual foi apresentada em 2017, na primeira etapa do processo de consulta, e rejeitada pelos Wajãpi em 2018, devido aos impactos que traria para suas comunidades. Desde então, o povo indígena aguardava a finalização de uma nova proposta governamental, incorporando as alterações solicitadas.
“O principal medo que nós temos é que, se não controlar (o uso da terra) e não tiver algumas regras, eles (os ocupantes do entorno da TIW) podem fazer de qualquer jeito, desmatando e prejudicando os nossos modos de vida”, ressaltou Roseno Waiãpi, Chefe da aldeia Wakowã e um dos organizadores do evento.
Durante a reunião, o superintendente do INCRA, Fábio Muniz, apresentou algumas propostas, entre elas o reassentamento de alguns ocupantes das áreas mais próximas aos limites da Terra Indígena que ainda não possuem títulos de propriedade e a atualização da relação dos beneficiários para o Programa Nacional de Reforma Agrária.
“O Incra está redefinindo o perímetro do Assentamento da Perimetral para que se adeque aos pedidos dos Wajãpi. Apresentamos a proposta final e os indígenas irão conversar entre si para que, na última etapa da consulta, informem se a aceitam ou não”, pontuou Fábio Muniz. Os Wajãpi defendem que os direitos dos assentados sejam respeitados e que aqueles que precisem ser realocados sejam indenizados e transferidos para uma outra localidade com melhores condições de infraestrutura.
“Essa reunião representa a concretização do direito fundamental à consulta prévia, livre, informada e com boa fé estabelecida pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho. O MPF, que acompanha desde o início esse processo, está presente para garantir que o direito de consulta seja respeitado pelos órgãos públicos, e que os Wajãpi possam participar ativamente e sejam respeitados em todo esse processo de consulta antes que a decisão seja tomada pelas instituições”, informou o procurador da República Alexandre Guimarães.
De forma pioneira no Brasil, o processo de diálogo dos Wajãpi com os órgãos responsáveis pelo assentamento e pela Floresta Estadual do Amapá vem sendo realizado de acordo com as regras estabelecidas pelos indígenas em seu próprio Protocolo de Consulta e Consentimento. De acordo com este documento, o próximo passo da consulta será a realização de reuniões internas entre os Wajãpi, quando discutirão a proposta dos órgãos públicos e decidirão a resposta que será dada ao governo.
“As propostas serão discutidas entre os chefes Wajãpi em nove reuniões regionais, que são as discussões internas, para saber se haverá o consentimento dos indígenas. Em dezembro deve acontecer a segunda reunião com os órgãos de governo, quando esperamos que os direitos sejam assegurados e que se tenha uma segurança jurídica para as áreas do entorno”, afirmou Rodrigo Siqueira Ferreira, o assessor de Programa Wajãpi, do Instituto Iepé.
O povo Wajãpi foi o primeiro povo indígena no Brasil a elaborar um protocolo próprio para orientar os órgãos de governo na realização de consultas prévias sobre medidas que os afetem. Elaborado em 2014, foi um marco no país e no direito dos povos indígenas. A consulta prévia é garantida na Convenção 169 sobre Povos Indígenas e Tribais, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), é lei no Brasil desde 2004 (Decreto Presidencial nº 5051) e é um direito dos indígenas de serem de consultados e participarem das decisões administrativas, por meio do diálogo intercultural marcado por boa fé.
A região fica a cerca de 300 quilômetros da capital amapaense, Macapá. A Terra Indígena Wajãpi, demarcada entre 1994 e 1996, é a maior do Amapá em extensão, com 607.017 hectares, e se localiza nos municípios de Pedra Branca do Amapari e Laranjal do Jari. É cercada pelo Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque, Floresta Estadual do Amapá, Reserva de Desenvolvimento Sustentável Rio Iratapuru, Reserva Extrativista Brilho de Fogo e Floresta Estadual do Paru (PA).
Texto: Alessandra Lameira / Consultora de Comunicação do Instituto Iepé (96)981197655
Fotos: Leonardo Rosa